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Independência e Crise

     A primeira metade do século XIX caracterizou-se por mutações políticas, particularmente na América Latina. Napoleão Bonaparte, produto da Revolução Francesa, contribuiu, diretamente, para que os latino-americanos dessem passos à frente na consolidação de suas nacionalidades. Surgiram nações independentes dos velhos centros colonizadores. A Revolução Industrial se processava na Europa, tendo a frente a economia inglesa que liderava os setores têxteis e metalúrgicos. Foi alias, o desenvolvimento d indústria de base inglesa que carreou recursos e meios à batalha de Waterloo (1815).

    O fato é que a fuga de D. João VI e sua vinda para cá descaracterizou o Brasil como colônia. Com a Independência, surgiram perturbações públicas: os portugueses que aqui não haviam rompido o cordão umbilical com a Europa, relutavam abdicar de seus pendores colonialistas. Respirava-se o ar da rebeldia e os desacatos às mais inverossímeis. Os desajustamentos de pretensões individualistas explodiam em reações violentas.

    As querelas surgidas entre os habitantes dos Campos Gerais eram, em ultima instancia, levadas ao conhecimento do Presidente da Província de São Paulo. As delongas na solução dos causos criavam malestar entre as partes, obrigadas pelas circunstancias a deixar a vila, para, longas distancias, aguardar o resultado.

    O Capitão-mór José Carneiro Lobo, cujas Arbitrariedade e violências JA mencionadas em capítulos anteriores, depois de reformado, requereu em 1829 ao Ouvidor Joaquim Teixeira Peixoto (a autoridade da Comarca) a posse de uns terrenos, sob alegação de ser sesmeiro dos mesmos. O escrivão da Ouvidoria viajou ao local para dar posse das terras ao requerente. Acontece que os terrenos pretendidos estavam no rossio da vila  a esta pertenciam, de forma que o Procurador da Câmara, juntamente com o Fiscal Antônio Domingues Garcia embargaram a referida posse, exibindo ao Ouvidor o Livro Tombo em que constava a demarcação do rossio, feita por ocasião da criação da vila.

    Se o capitão já estava exacerbado com alguns habitantes, mais revoltado ficou com os camaristas. formou partido e se pôs a aliciar gente contra a câmara e seus membros. No anos doe 1832 impugnou as eleições, denunciando o Juiz de Paz e Presidente da Mesa Paroquial Joaquim José Borges de haver sido subordinado. A denuncia foi dirigida pelo capitão e seus sequazes diretamente ao Presidente da Província. Houve inquérito e a verdade veio a tona: tanto José Carneiro Lobo com seu compadre o Juiz de Paz Lourenço Marcondes Ribas não conseguiram seu intento.

     Carneiro Lobo retirou-se para a vila da Faxina ( hoje, Itapeva), mas o espírito político permanecia na vila.

    Saint'Hilaire elogia este Carneiro Lobo que o recebeu muito bem e fazia questão de lhe ser útil, propiciando ao cientista francês o que se lhe figurava melhor na região.

    O aparecimento politico de José Carneiro Lobo aconteceu quando seu pai, o Coronel Luciano Carneiro Lobo que era o Capitão-mór da vila, passou para o corpo de milicias. Então, aos 2 dias do mês de abril de 1821, o Ouvidor geral Doutor José Carlos Pereira de Almeida Torres, presidindo a reunião da câmara dos vereadores, leu oficio do governador da província para se eleger três nomes, a fim de comporem a lista, da qual o governo escolheria um deles para nomear Capitão-mór. "O primeiro eleito foi o Sargento-mór José Carneiro Lobo, por concorrerem nele os requisitos da Lei, como são o lugar do posto imediato de Sargento-mór da Ordenanças, com exercício de comandante em falta do capitão-mor, tendo servido no Corpo de Milicias bastantes anos até o posto de tenente; por der maior de quarenta anos, de boa linhagem, cristandade e do agrado e satisfação dos povos. O segundo eleito, o capitão de Ordenanças Lucio Alves Martins Gavião, por concorrerem também nele os requisitos seguintes: Serviu no Corpo de Milícias vinte sete anos, passando da patente de tenente que ocupava no dito corpo para capitão atual de ordenanças; acha-se com idade de quarenta e cinco anos, de boa linhagem e cristandade, e tendo ocupado todos os lugares e empregos públicos com grande satisfação dos povos. O terceiro eleito, o Capitão Benedito Mariano Ribas, tendo servido já no corpo de Milicias é hoje Capitão de Ordenanças, com mais de quarenta anos de idade e de boa conduta, linhagem e cristandade, e todos os ditos nomeados com propriedade no País e abastados em bens e por terem assim feito sua eleição, encarregaram a mim, escrivão, extraísse o presente termo, por certidão, para ele, Ministro, remeter à autoridade competente etc." (Livro de Atas n. II, 1800/1824).

    José Carneiro Lobo foi escolhido pelo governo paulista, prestando compromisso, perante a Câmara, no dia 23 de abril de 1821 (livro citado). Seu pai, o Coronel Luciano, gozava então, de grande prestígio, havendo sido, em 29 de maio de 1822, indicado para ir, em nome do povo dos Campos Gerais, cumprimentar o Príncipe Regente Pedro I, quando chegasse à capital da Província. Estávamos nos dias do Grito do Ipiranga.

    A escolha de José para o comando das forças armadas nos Campos Gerais, com sede na Vila de Castro, implicava no apoio da governança da província. A vaidade e o orgulho subiram-lhe a cabeça. Queria fazer da Ronda sua residência e também o quartel da tropa sob seu comando. A contrariedade dos moradores revidou com violências. Seus partidários seguiam a exemplo, mesmo despois de reformado e se ausentando para Faxina. Seu compadre Lourenço Marcondes Ribas assumiu a Vara do Juízo da Paz, nos primeiros dias do mês de janeiro de 1834. No dia nove desse mês, às 13 horas, na casa de Antônio Domingues Garcia, foi cruelmente assassinado o Procurador da Câmara, o Alferes das Guardas Nacionais Antônio José da Cunha Viana, por dois indivíduos armados de pistolas, espadas e facas, "que depois de darem-lhe um tiro e vinte tantas facadas, com alguns golpes de espada, saíram são e salvos desta vila, a pé e devagar, vestidos de ponche, sem que fossem pela menor criatura, perseguidos" (livro de Atas da Câmara Municipal, ano de 1834). O juiz municipal Interno Joaquim Gonçalves dos Santos, em 13 de março de 1834, oficiava à câmara, desocupando o lugar, "por ameaças que lhe tinham feitos os seus inimigos que a peito descoberto prometem desatender as autoridades e assassinar lhe, o que sabia por pessoas de suas amizades e digna de conceito" (Livro de Atas citado).

    Joaquim estava apavorado. Queria pedir licença À Câmara para "ver se ia livrar a vida", como diz em seu oficio, mas, sem esperança que a Câmara se reunisse, pelos mesmos motivos, deixava seu requerimento e aperou sua comitiva, juntou seus homens e se largou para o Sul.

    Na Ausência do juiz municipal, alguns camaristas se reuniram e nomearam o Sargento-mór Benedito Mariano Ribas, e depois de seis meses, a Câmara fazia sessão, aos cinco de maio de 1834, nomeando uma comissão para informar o Presidente da Província. Rafael Tobias de Aguiar, na presidência da Província de São Paulo, insistia em ofícios que não eram respondidos oficialmente, no integno da crise. Nada se arrecadava. E governo sem arrecadação de subsídios (impostos e taxas) de apavora. Felizmente, para sossego da província, os camaristas se refizeram e a comissão elaborou um relatório:

    "Com efeito, afastou- se do seu primeiro dever esta câmara, não só porque não procurou manter a boa ordem e tranquilidade publicas, mas inteiramente inteirada de que não foi motivada por desleixo, mas sim porque a mor parte de seus membros se achavam aterrados pelas ameaçadoras notícias de que os facinorosos pretendiam atacar os membros desta câmara, que rústicos e timoratos, apreciando a preciosa vida, não procuraram meios de prevenir os males e sim, acautelaram-se, agarrando-se cada um em suas casas, como é público. A câmara achando-se sem respeito e sem força de tomar medidas sobre os males cometidos, receando em tal crise dar passos desagradáveis ao |Governo Constitucional, deixou de se reunir, guardando o mais profundo silencio. Pela mesma razão julga, vivem horrorizados os povos e alguns empregados que nem levemente, em tempo algum, quererão ter parte no facinoroso partido dos inimigos da lei. Pelo oficio do juiz municipal interno Joaquim Gonçalves dos Santos se vê as tristes circunstâncias a que tem chegado este malfadado município, cujo oficio requer a comissão seja remetido para, fazendo parte da resposta ao oficio do Exmo. Senhor Presidente, pelo qual se mostra a realidade que teve predominado nesta e o ponto mais desgraçado a que tem chegado, cujos criminosos fatos a  comissão não podo remeter ao silencio, não só por ser de sua rigorosa obrigação, como também por dar execução À ordem do excelentíssimo presidente da província. Bem a custo reuniu-se agora esta câmara no dia cinco do corrente, despois da chegada do Doutor Juiz de Direito (Agostinho Ermelino de Leão), esperando que talvez, com a esperança deste novo magistrado se restabeleça  boa ordem, se respeitem as leis e que finalmente sejam severamente punidos os violadores das leis".

    No relatório do fiscal, apresentado em Junho de 1834, dia 2, consta que os funcionários eram José Bicudo e o filho deste de nome Miguel, moradores na Faxina, a mando do reformado Capitão-mór José Carneiro Lobo e seu filho Silvério Carneiro Lobo, coadjuvados por outros mais. Relata ainda que o presidente da câmara de então, Manoel Inácio do Canto e Silva não tornou nenhuma providencia, talvez par ser um dos ameaçados, estando par isso em sua fazenda, com guardas, da mesma forma que outros mais, pacíficos cidadãos.

   Consta, nos livros de atas, no entanto, que Manoel Inácio licenciou-se, alegando moléstias, e foi para São Paulo; Balduino Taques, alegando negócios, viajou para a Vila do Príncipe (Lapa); o Juiz de Paz (como o nome indica, era a autoridade da ordem) Lourenço Marcondes Ribas, compadre do ex-capitão José, Fazia ouvidos de mercador aos apelos de providencias contra as desordens na vila, tolerando malfeitores, relaxando prisões e não convivendo entre os habitantes, enfurnado em sua fazenda  os membros da Junta de Paz e do Conselho de Jurados deixaram de se reunir em Castro e foram para Ponta Grossa, então com a predicado de simples freguesia, porem com latifundiários fazendo parte da governança da Vila de Castro. 

    Em consequência dessa rebordosa no maior concentrado populacional dos Campos Gerais, o centro politico do sul teve sobressaltos, do que resultou lamentações, como veladas censuras e recomendações, como já dissemos na publicação "Casos e Causos Paranaenses":   Por ocasião de instalar-se a Assembleia Legislativa Província de São Paulo, na data de dois de fevereiro de 1835, o presidente da Província Rafael Tobias de Aguiar apresentou relatório sobre o estado dos negócios públicos e sobre as providencias que entendeu necessários adotar.

   Entre outras coisas, diz ele em seu relatório:  "A Província acha-se dividida em seis Comarcas, contendo sessenta Termos e cento e setenta e nove Distritos. Sobre os Termos só tenho por ora, representações acerca da Vila de Castro, que se Julga não poder continuar pelo pequeno numero de jurados, mas atribuindo isto ao espirito de partido que infelizmente ali deve ter aparecido pelo julgamento dos crimes que se cometeram anteriormente, com escandalosa omissão das autoridades, tendo mandado proceder a outros exames para conhecer a conveniências desta alteração". 

   "A Expedição de Guarapuava não tem saído do estado de atraso em que uma acanhada administração a reduziu, tendo sido ineficazes todas as providencias que o Governo tem dado, porque não tem sido possível afastar o Comandante de sua marcha rotineira, e por isso tenho em vista mandar para ali outro oficial que prometa mais no desempenho de tão importantes obrigações, ainda que isto acarrete algum aumenta de despesa, o que se torna tanto mais necessário quanto ora se requer maior inteligência e atividade no Comandante, visto que o Governo Imperial resolveu que naquele lugar se estabeleça uma Colônia de degradados, a qual julgo conveniente fundar além do rio Iguaçu, tanto para dificultar a fuga que procurarem evadir-se, e povoar-se os campos do Corvo, Palmas e Laranjeiras que apesar de quase desconhecidos, passam por bons e extensos, como evitarem-se contestações com os vizinhos, que no volver das anos podem suscitar as pretensões que tiveram sobre Vila Rica e Guairá, outrora destruídas por nossas antepassados".  

   "Achando-se presentemente restabelecida a ordem e tranquilidade publica na Vila de Castro, par não terem felizmente prosseguido os tristes acontecimentos que ali tiveram lugar, par cujo motivo foi ordenado que a Junta de Paz e o Conselho de Jurados se reunissem interinamente na Freguesia de Ponta Grossa, o Presidente da Província ordena que as mencionadas reuniões tenham lugar d'ora em diante na referida Vila, visto ser cabeça de Termo: o que participa a Câmara Municipal respectiva para sua inteligência e devida execução. na parte que lhe toca. Palácio do Governo de São Paulo, 6 de março de 1835. (a) Rafael Tobias de Aguiar."

    Como se vê por esse relatório, o governo da província nenhuma atuação teve nos acontecimento quer preventiva, quer punitiva. A confusão foi resolvida pelos camaristas, como, alias todos os  surgidas nos Campos Gerais eram resolvidos ou não pelos seus próprios habitantes e representantes na Câmara Municipal de Castro.


Os Iapoenses - Oney Barbosa Borba

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